Quando respiro, sinto o brilho granulado do vazio
como uma faca
embainhada na garganta,
o ar levanta as vértebras de um sopro tangendo
cordas farelentas
no vaso de água dos cabelos.
Se corto a carne mole dos pulmões
vejo vernizes oleosos refletidos na frieza
da minha faca e o vagido arenoso da língua se dissipa
numa espuma carvoenta,
é a fresca plumagem do sangue,
unhas descendo pelos dedos, dentes saindo da gengiva,
cabelo germinando como erva e o corpo
sinuoso
de uma sombra
desce às entranhas
da pupila
espalhando sua têmpera nodosa
sob o caule da
cabeça.
A glande úmida, de veios engrossando,
expele
um vapor cálido leitoso, é a força relutante
da palavra sob o ato de estupor molhado da garganta,
carnação demencial que escorre das maçãs
como um líquido
febril mistura-se à polpa açucarada na penumbra.
Vejo dedos deslizando entre coágulos de luz
que pairam na cortina,
escamas borrifadas num sonoro
ar de mármore.
A casa oscila dentro da vidraça como uma fogueira.
Tenho um corpo endurecido,
amálgama dos sinos espancados.
Lembro um pássaro morto,
o negrume das penas estufadas encharca
a respiração.
Tenho um corpo azedo e
o golfo macilento das pupilas,
infestado de formigas,
parece sucumbir à pele gordurosa
das entranhas
num torpor avinagrado.
O bico se desagrega, a carne roda,
troncos, fios de junco, talos eriçados,

À luz granitada do silêncio
levo as vértebras do cálamo e
afio a têmpera azulada que sibila
na tintura da garganta e o acorde
invertebrado da respiração escorre
na medula
dos meus olhos,
invisivelmente redigido como um
ímã
em meio à textura milagrosa dos
escombros.