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#24PausaCidadesCulturaLiteratura

São Paulo Riviera (João)

por Kathleen Maccaul

Segunda-feira à noite
Hotel Banri
Liberdade

João da Silva se afundou na sombra da entrada do restaurante, desviando do vapor com cheiro de peixe que vinha da cozinha. Estava quieto, os bares na rua eram pequenos, discretos. Portas pretas, luzes vermelhas, às vezes uma placa com escritos em japonês, às vezes nada. Só o Hotel Banri exibia uma placa luminosa. Comida barata na Liberdade. João se perguntou se o hotel também funcionava como bordel. Aquelas garotas asiáticas matando tempo no lobby, seus olhares cautelosos e rostos cobertos de pó de chumbo branco.

Ele respirou fundo. O ar estava pesado, uma tempestade se aproximava. Ele esfregou a testa, pegou o maço e tirou um cigarro. Era um trabalho sem futuro: sabia disso. Era um tédio. João estava entediado até não poder mais. Tudo que ele fazia era segurar uma arma e ignorar os crimes. Ele havia tido uma péssima sorte, fora assinalado para a pior DP de São Paulo. A 18ª DP da Brasilândia, uma favela difícil. Fazia a Vila Matilde parecer Paris, ou outro lugar do tipo. Traficantes vendiam crack do lado de fora da delegacia. João não ia fazer eles pararem. Ele tinha que pegar o ônibus para casa. Talvez, se ele tivesse sido colocado em algum outro lugar, teria jeitos de se provar, teria uma chance. Mas não na 18ª. Você só podia baixar a cabeça.

João balançou seu isqueiro, apertou a roda e assistiu a chama dançar em frente ao cigarro. Ele inspirou a fumaça e fechou os olhos, se afundando no gosto, tentando pensar em uma forma de mudar a própria vida. Ele ficou daquele jeito até que um facho de luz, muito mais forte que o seu isqueiro, mas tão rápido quanto, atingiu seu rosto. Ele abriu os olhos, mas só conseguia ver manchas de cor. Estremeceu por alguns segundos, se acostumando com a escuridão. De repente, sentiu silêncio. O vibrar metálico de antes havia sumido. João espiou a rua silenciosa. Vislumbrou a silhueta de uma moto. Dois homens. Pareciam estar mascarados. Esperando no escuro. Alguns anos atrás, isso significava um esquadrão da morte, a parte mais corrupta de um sistema já podre: policiais fora do horário de serviço que eram contratados como matadores de aluguel. Eles se tornaram tão poderosos que dominaram os bairros, cobrando por proteção, matando quem quisessem. Seu próprio quartel havia se tornado famoso por esses casos. Mas os esquadrões da morte supostamente não existiam mais. Um Brasil novo.

Ele olhou de relance para as cinturas dos homens. Eles estavam armados. Mas já haviam conferido João com a lanterna e não iam gastar munição nele. Estavam atrás de outra pessoa. Alguém que estava comendo no restaurante. Ele não havia treinado para isso. Deixara o distintivo e a arma em casa.

“Cara, o que você está olhando?” falou uma voz ríspida.
“Sou polícia”, ele disse, e fechou os olhos.

Uma risada abafada e, então, outra voz, mais baixa que a primeira.

“Pode voltar para dentro. Finge que não está acontecendo nada. Não cria confusão.”

João se virou lentamente e entrou no restaurante. Sentia a parte de trás de sua cabeça muito frágil e seus passos estavam longos e distorcidos. Ele não tinha muito tempo. Sua visão começou a escurecer enquanto olhava as mesas: a família japonesa comendo macarrão? A menina encurvada sobre um prato de sopa? O casal de mãos dadas comendo um barco de sushi? Não, não. É claro que era Rato, seu braço nos ombros de alguma garota, tomando uma bebida idiota. A pele de João se arrepiou enquanto assistia ele rindo. Ele era feio e idiota e criminoso. Mas mesmo assim, era apenas um garoto. João tinha que alertá-lo. Talvez algo bom pudesse vir disso, para ele mesmo, se fizesse a coisa certa.

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