Skip to content
Revista Amarello
  • Cultura
    • Educação
    • Filosofia
    • Literatura
      • Crônicas
    • Sociedade
  • Design
    • Arquitetura
    • Estilo
    • Interiores
    • Mobiliário/objetos
  • Revista
  • Entrar
  • Newsletter
  • Sair

Busca

  • Loja
  • Assine
  • Encontre
#7O que é para sempre?CulturaSociedade

Peso, Lânguida e Sísifo

Perplexos diante de um tempo de incertezas e mudanças, movimentamo-nos. Os lugares parecem cheios e nem por isso sentimos conforto ou segurança.

Nosso mundo ora parece ameaçador, ora divertido. Enquanto cada um cumpre sua trajetória, aproximam-se nossos personagens.

Uma mulher, feita de fios e camadas: Lânguida era seu nome.

Bela, vazia, de um andar macio que quase não pisava o chão.
&
Peso: uma criatura de massa, de cérebro enorme e seis patas, e com uma mala ocupada por montes de bagagens; sempre prevenido e tentando antever suas necessidades. Não tinha amigos, pois não os julgava necessários.

Além do óbvio, carregava amuletos porque acreditava numa sorte que nunca tivera, mas para a qual, se lhe aparecesse um dia, queria estar preparado.

E pensava em suicídio…

Aqui interrompemos nossa narrativa. Quem quiser saber mais terá de aguardar a publicação do livro e então descobrir, por exemplo, como nossos hoeróis encontram tal lenda viva.

Sísifo

Na Grécia Antiga, mais precisamente em Corinto, viveu um homem que – ao enganar os deuses e, pois, a própria morte – se tornaria um mito. Seu nome era Sísifo e diziam ser o mais esperto de todos os homens. Sua astúcia lhe rendeu uma fortuna como comerciante, até se tornar rei da bonita e próspera cidade de Corinto. Ali se produzia a mais bela cerâmica do mundo antigo, região sobre a qual os navios que vinham da península Itálica, pelo mar Adriático, eram atravessados de modo a chegar ao Egeu e continuar viagem ao Oriente.

E foi ali que Sísifo viveu, reinou e fez sua fortuna. Certo dia, andava por suas terras quando viu um pássaro carregando a linda Égina. A moça estava desaparecida, todos sabiam disso, e seu pai a procurava. Sísifo reconheceu, no disfarce do pássaro, Zeus – o chefe de todos os deuses do Olimpo. Assim, foi ao pai da moça raptada e trocou esse segredo por uma fonte de água para seu reino. Zeus ficou furioso! Como um simples mortal poderia ter a audácia de denunciá-lo?

Imediatamente, mandou Sísifo ao Hades – o mundo dos mortos. Mas ele, esperto, não se deixou vencer. Valendo-se de um truque, acorrentou Tânato, a própria morte, e voltou para o mundo dos vivos, resultando também em que, com a morte imobilizada, ninguém mais morresse nas batalhas. Irado, o sangrento deus da guerra, Ares, foi saber de Hades por que aquilo ocorria.

Descobriram então o truque de Sísifo e libertaram Tânato. O fugitivo, portanto, teria de retornar ao mundo inferior – e sua vida estaria acabada.

Sua esperteza, porém, não se esgotava e, antes de regressar, instruiu sua esposa a jogar seu corpo nu em praça pública, não lhe dedicando rito sagrado algum. A mulher, obediente, assim o fez.

Quando o astuto Sísifo novamente chegou aos mortos, convenceu o próprio Hades a que lhe deixasse retornar, uma vez que não merecera o cerimonial necessário.

Os rituais eram importantes. Se Sísifo não os recebesse, nenhum mortal os respeitaria mais – o que desmoralizaria o próprio senhor da morte, Hades. Sísifo teve de regressar aos vivos para reclamar seus rituais – apenas após os quais poderia morrer.

Mas, esperto, já traçara seu plano – e nele cabia tudo, menos o mundo dos mortos!

Assim foi: viveu até sua velhice, ali, perto de sua esposa, vendo seus descendentes, uma geração após outra, e só quando estava bem velhinho entregou-se ao reino de Hades.

A esperteza de Sísifo não passaria despercebida, no entanto, Zeus mandou-lhe um castigo terrível: para sempre empurraria uma pedra muito pesada morro acima, só para que, quando chegasse ao cume, a visse rolar para baixo. Essa foi a pena que Sísifo recebeu por enganar Zeus, querer driblar a própria morte e assim se igualar aos imortais do Olimpo.

********

O que pode significar o Mito de Sísifo? A busca – em vão – do homem pelo conhecimento? A dedicação para construir coisas e obras que perduram ou que serão destruídas? Seria o sol, que se levanta todos os dias? Uma metáfora para o empenho dos políticos em sua constante luta para chegar ao poder – uma jornada vazia e sem sentido? O esforço absurdo que fazemos – no curso de uma vida comum, em que acordamos diariamente, trabalhamos, empreendemos outras tarefas, comprometemo-nos com pessoas – mesmo sabendo que o fim será a morte?

Podemos também imaginar Sísifo como um homem conformado com seu destino?

Caros Peso e Lânguida,

Desafiei medos como um gigante, encarei a existência como algo possível e amorável. Usufruí de minha vida de jovem com toda força e vitalidade. Ah! Como era bom sentir a força de meus braços bronzeados, e como me diverti com minhas ideias e negociações, as quais me trouxeram tanto poder e dinheiro! Como era divertida a minha vida, cheia de emoções, de prazeres, de sofrimentos e de conquistas!

Tive tudo que um homem pode desejar: um casamento feliz, o amor das mulheres, prestígio político! Chorei de emoção, chorei de dor, chorei pela vitória e pela derrota. Nunca me acovardei nem temi ser roubado ou castigado. E ainda deixei no mundo descendentes, um deles ninguém menos que o próprio Odysseus! Reconheço que isso me levou à híbris e, portanto, a subestimar a força dos Olímpicos. Mas, como saber disso quando se é jovem e o mundo parece se desdobrar a seus pés e a suas ideias?

Ah, quanto se divertiu esse velho Sísifo que lhes fala agora! E como me divertia quando via meu nome falado em toda Ática, na Europa Central e até entre os bárbaros.

Meu nome saiu da boca de gente comum tantas vezes até entrar para a história, para a literatura, para a filosofia. Fui ao mundo para ser destemido como Aquiles, para celebrar cada gota de vida como Dioniso, cada grão de terra como Deméter. Meu destino se tornou uma metáfora importante para a humanidade. Afinal, o que significam a vida, o esforço e o tempo? O sol nascente e o sol poente? Minha sina de carregar essa pedra? O recomeçar todos os dias? O continuar de um trabalho, como uma linha vertical cruzando a horizontal do tempo… Na labuta existe sinceridade e um amor imenso à eternidade. Como as pessoas são tolas de subestimar os velhos: eles têm, dentro de si, dentro dessa aparência desdentada, toda a lembrança do corpo jovem, mais a memória do que viram, mais a certeza de sua finitude humana. E é com essa boca de velho que lhes falo.

Além do mais, posso ser um velho, mas me sobraram força e braço para empurrar a pedra. Não sou um deus – mas sou imortal. Reconheço que é tentadora e bela a ideia de me libertarem. Mas penso… Vivi há mais de três mil anos; vi muita coisa. O mundo se transformou enquanto eu rolava a pedra, e aqueles que pensavam na condição de Sísifo não percebiam que Sísifo sabia e via o que se passava com o mundo. Agora os problemas da humanidade parecem tão gigantescos. Afinal, o degelo polar e a mudança de clima não são tão monumentais quanto a guerra entre deuses e titãs!? E a imensa fome pela qual passa um continente inteiro, não será do tamanho daquela que se enfrentou quando Hades raptou Perséfone, e Deméter, enlutada, pôs todos os campos a secar? Vocês, esquisitos meninos de formas estranhas, têm vontade de me libertar. E a que devo ser grato? Por me darem a ideia que podem me libertar ou por me oferecerem sua imortal e valorosa amizade? Ou ainda por passarem para o mundo, mais uma vez, minha velha história?

E lhes pergunto ainda: do que querem me salvar? Qual a dor que vocês sentem ao me ver rolando a pedra?

Sísifo é homem com a pedra; se a pedra parar, Sísifo não mais existirá.

Um abraço do amigo,
Sísifo

Compartilhar
  • Twitter
  • Facebook
  • WhatsApp

Conteúdo relacionado


Sonhos não envelhecem

#49 Sonho Cultura

por Luciana Branco

Horácio Costa conversa com Roberta Ferraz

#39 Yes, nós somos barrocos Cultura

Artistas-programadores e a automatização da arte

#27 Perspectivas Arte

por Patrícia Oakim

O Naufrágio

#32 Travessia Arte

por Thais Graciotti

Itcoisa: Oleiros

Design

por Gil Alves

Mero detalhe

#15 Tempo Cultura

por Léo Coutinho

Marca Beleza

#14 Beleza Cidades

por Saul Taylor

Tensões entre cor e amor: construções sociais nas relações de afeto

Cultura

por Gustavo Freixeda

Dois e dois são dois: Jorge Caldeira e Alexandre Villares

#29 Arquivo Cultura

Abraçar aquilo que não controlamos

#42 Água Fotografia

por Gustavo Freixeda

A dançarina

#48 Erótica Literatura

por Thais Nunes

Antes do Feminismo: portfólio Berna Reale

#28 O Feminino Arte

Sem presença na internet você não existe?

#44 O que me falta Cultura

por Manuela Bernadino

  • Loja
  • Assine
  • Encontre

O Amarello é um coletivo que acredita no poder e na capacidade de transformação individual do ser humano. Um coletivo criativo, uma ferramenta que provoca reflexão através das artes, da beleza, do design, da filosofia e da arquitetura.

  • Facebook
  • Vimeo
  • Instagram
  • Cultura
    • Educação
    • Filosofia
    • Literatura
      • Crônicas
    • Sociedade
  • Design
    • Arquitetura
    • Estilo
    • Interiores
    • Mobiliário/objetos
  • Revista
  • Amarello Visita

Usamos cookies para oferecer a você a melhor experiência em nosso site.

Você pode saber mais sobre quais cookies estamos usando ou desativá-los em .

Powered by  GDPR Cookie Compliance
Visão geral da privacidade

Este site utiliza cookies para que possamos lhe proporcionar a melhor experiência de usuário possível. As informações dos cookies são armazenadas em seu navegador e executam funções como reconhecê-lo quando você retorna ao nosso site e ajudar nossa equipe a entender quais seções do site você considera mais interessantes e úteis.

Cookies estritamente necessários

O cookie estritamente necessário deve estar sempre ativado para que possamos salvar suas preferências de configuração de cookies.

Se desativar este cookie, não poderemos guardar as suas preferências. Isto significa que sempre que visitar este website terá de ativar ou desativar novamente os cookies.