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#18RomanceCulturaSociedade

Call it magic, call it true

por Helena Cunha Di Ciero

Will you let me romanticize,
The beauty in our London Skies,
You know the sunlight always shines,
Behind the clouds of London Skies.

Jamie Cullum

Uma amiga foi na cartomante pedindo a volta do seu amado: “Come o nome dele durante sete dias”, disse a senhora. A jovem apaixonada, formada, madura e bem resolvida, saiu de lá decidida: passou uma semana engolindo um papel com o nome do moço, em jejum. Levantava da cama e, numa folha, escrevia até o sobrenome do eleito. Sim, ele voltou depois de um tempo.

Tem algo de triste e de bonito nessa cena de mulher apaixonada que suplica para um amor não partir. Podia ser eu, uma prima, uma vizinha. Onde há amor, há romance e magia. Toda mulher, em algum momento da vida, se torna menos princesa, mais bruxa em defesa do território do encantamento. Qualquer loucura é justificável para a preservação do sonho. Chico Buarque canta lindamente a cena da mulher abandonada: “dei para maldizer o nosso lar, para sujar seu nome, te humilhar e me vingar a qualquer preço, te adorando pelo avesso… para mostrar que ainda sou tua”. Mesmo Shakespeare se curvou dizendo que, entre o céu e a terra, não existe fúria maior que a da mulher rejeitada. E a velha Medeia é a precursora desse movimento.

“Malévola” é um filme revolucionário: a fada que se vinga do homem que corta suas asas com ferro quente em troca do poder de outro reino. (Será que há imagem mais rica do que essa para falar de amor? Se esse é o sentimento que rouba nossa liberdade e entrega de bandeja ao outro? Dizem que o primeiro amor é educativo, nunca nos entregamos novamente com a mesma força e ingenuidade da primeira vez.)

Desiludida pela traição de seu amado, a personagem transforma-se numa bruxa poderosa e vingativa. E lança seu feitiço para a filha do homem que a trocou por outro reino. A bruxa, porém, observando a Bela princesa crescer, vai entrando em contato novamente com outro amor, o materno – e sua ira vai sendo suavizada.

Perfeição politicamente correta falta à Malévola para ser a protagonista de um conto de fadas, mas sobra humanidade – o que a torna apaixonante para o espectador, que perdoa e compreende suas charmosas travessuras de “bruxa má”, e, solidário, identifica-se com ela. Afinal, ridículo é quem nunca escreveu uma carta de amor.

Me pergunto se a Bela Adormecida não representa essas mulheres que passam a vida inteira aprisionadas num sonho de ideal romântico esperando que alguém generosamente as desperte. Um amor como solução de todos os problemas, como a causa de um despertar. Mas, no filme, o único amor passível de despertar a Bela Adormecida seria o materno. Esse, sim, teria a condição da eternidade. O resto são só promessas.

Sou de uma geração que cultuava a perfeição das princesas: Cinderela vitimizada, a alva pele de Branca de Neve e sua pureza. Tudo muito cindido, o bem contra o mal, bruxas contra príncipes, a Bela e a Fera. Confesso que fico esperançosa pelos novos ventos que se apresentam, quando um dos maiores livros de sucesso infantil, atualmente, tem como título: Até as princesas soltam pum. Tomara que minha filha (se eu tiver uma) não viva em busca de ser perfeita e à espera de um príncipe encantado e sem sal. Talvez essa próxima geração escape dessa ilusão do amor perfeito. Talvez.

A minha ainda sofre dessa herança do sonho de uma vida cor de rosa. A menina que sonhava em ser uma princesa desperta depois de um longo tempo de baladas em Maresias, trilhas e viagens à Bahia dormindo em pousadas nas-quais-toma-se-banho-de-havaianas. Esse despertar se dá ao conhecer um rapaz que novamente a faz acreditar que existe, sim, um final feliz, que é possível ser uma princesa. Ah, o amor…

As festas suntuosas de casamento quase enganam as jovens moças de que a vida adulta é pura celebração. Escolha o vestido que você quer minha filha, faça sua lista de presentes, dê uma linda festa, convide todos os seus amigos, vá ao melhor maquiador, encha de flores e boa música “e bibidibobidiboo”: gire as saias do seu vestido na pista de dança de olhos bem fechados – vai quase ser real. E, na volta da lua de mel, que susto! Existe um negócio chamado conta de açougue, o namorado apaixonado é meio bagunceiro, tem que arrumar a cama e nada disso parece assim tão encantador depois que a noiva vira abóbora e se torna esposa. (Abóbora mesmo, pois, na lua de mel, a gente engorda tudo que tinha emagrecido antes de casar.)

Essa tal lenda do príncipe encantado acaba com o mercado masculino, já que ocupa um ideal de impossível competição. Não dá para comparar um marido que vem com mil defeitos (assim como as mulheres) com o príncipe encantado tão sonhado e propagado há gerações nos contos de fada.

Mas ninguém contou também que o dia a dia tinha lá seus encantos, escondidos no meio da rotina, de uma dupla que opta por tentar se aventurar no mundo numa parceria, abandonando um universo que anteriormente era confortável. É preciso muita coragem para sair do reino conhecido e começar uma vida nova. E que há também algo de mágico no aconchego de voltar para a casa e ter alguém ali que te desafia e convoca a buscar amor todo dia, dentro de esconderijos internos, para suportar a tal da convivência.

O excesso de romance por vezes acinzenta a realidade. Faz com que a gente espere muito do que vem de fora e estrague o que tem, só porque não é assim tão mágico. Mas é de verdade. Anos de lágrimas podem ser economizados se essa figura encantada deixar de ser tão importante, tão definidora, e puder ser simplesmente uma pessoa, que assim como a gente está tentando acertar. E não é eterna. Não existe o para sempre. Para sempre é muito tempo. Ainda bem.

Talvez o conto de fadas do futuro termine com: felizes por enquanto. Tirando esse peso da eternidade, nos aliviamos e, de brinde, valorizamos o hoje: se não é eterno, preciso aproveitar, cuidar. E principalmente: sobrevivo sem. Embora essa última parte a gente esqueça quando apaixonado. E talvez precisemos disso para amar… Afinal, somos reféns do romance e dos clichês, todas as cartas de amor são ridículas mesmo. Sem elas, a vida perderia o pó de pirilimpimpim. Freud define o sonho como um processo vital e necessário para que suportemos estar acordados. Isto é, suportamos a realidade, pois dela nos retiramos quando sonhamos. Sem a ilusão, o mundo gira numa constante repetição, fria e acinzentada.

Assim como Dom Quixote precisa de Sancho Pança para fincar os pés no chão, a vida real precisa do romance e da ilusão. Sem esses temperos, tudo fica morno, sem sabor. De fato: não há um final feliz no fim do conto de fadas da vida, mas pode haver bons momentos durante o caminho das pedras amarelas, bem ali, somewhere over the rainbow. É só não nos esquecermos de fechar os olhos de vez em quando e sonhar.

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