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Reaprender a olhar: os museus na batalha pela atenção

De aulas de yoga a experiências sensoriais, espaços tradicionais se reinventam para além da qualidade dos seus acervos.

Vivemos numa era em que a atenção se tornou um bem raro. Sufocados pela ubiquidade dos smartphones e imersos numa infinidade de conteúdos que dividem a atenção de qualquer um, cada segundo do nosso olhar é disputado. Para os museus, isso representa um desafio duplo: atrair visitantes e, mais difícil ainda, mantê-los conectados à experiência. Ir a um museu, afinal, deveria ser um ato de contemplação — parar, observar, absorver. Mas a dificuldade não vem apenas de fora e das demandas de um mundo digitalizado; muitas vezes, a própria estrutura tradicional dos museus impõe barreiras à verdadeira apreensão da arte.

Em 2001, os pesquisadores Lisa Smith e Jeffrey Smith conduziram um estudo seminal, Spending Time on Art, para entender o comportamento dos visitantes de museus — quem são, como interagem com as exposições e, principalmente, quanto tempo realmente dedicam a cada obra. A pesquisa revelou que, na época, o tempo médio de observação de um quadro em um museu era de 27,2 segundos. Considerando que esse estudo foi realizado quando a internet ainda não estava tão entranhada no dia a dia das pessoas, é provável que esses números sejam ainda menores hoje.

No Louvre, o museu mais visitado do mundo, as multidões em frente à Mona Lisa tornam praticamente impossível a contemplação significativa da pintura — uma experiência que frequentemente resulta em frustração, como ocorreu em janeiro deste ano. Com 35 mil obras expostas e quase nove milhões de visitantes anuais, é razoável questionar se as pessoas realmente absorvem o que veem ou apenas percorrem um circuito de imagens para serem registradas em suas câmeras e posteriormente postadas nas suas redes sociais. Ciente desse desafio, aliás, a diretora do museu, Laurence des Cars, defende a modernização da experiência do visitante e já planeja reformas, incluindo uma nova entrada e uma sala exclusiva para a Mona Lisa. Vale notar que o esforço tem como objetivo fazer com que as obras sejam apreciadas da melhor forma possível e não atrair mais visitantes. Neste caso, ao contrário de tantos outros, a preocupação é museológica, não financeira.

Assim como o Louvre, muitos museus buscam soluções para manter a atenção do público — e, às vezes, isso exige inovação. O Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro aposta em experiências imersivas e interativas, seguindo uma tendência global de engajamento sensorial. Outros, como a Manchester Art Gallery, escolhem o caminho oposto: um acervo reduzido, que incentiva a imersão profunda em cada peça. É o caso do Room to Breathe, um espaço dentro do museu britânico projetado para capturar a atenção pelo mínimo estímulo. A proposta, na verdade, é simples: desacelerar, dedicar tempo ao olhar e, assim, perceber nuances e detalhes que passariam despercebidos. Em outras palavras, trata-se de ressignificar a contemplação — seja na arte ou na vida —, criando uma relação mais íntima com aquilo que nos rodeia.

Mas qual dessas é a melhor estratégia? Tornar os museus mais interativos ou abraçar um modelo mais contemplativo?

A resposta pode estar na diversificação. O Museu Nacional de Arte Moderna de Tóquio (MOMAT), por exemplo, criou um percurso pensado para quem tem pouco tempo, destacando poucas obras, mas com um contexto mais aprofundado. Já o Rijksmuseum, em Amsterdã, propõe visitas “desconectadas”, incentivando os visitantes a guardarem seus celulares e se concentrarem na experiência direta com as obras.

Outras galerias adotaram uma proposta mindfulness, que acaba sendo multimodal. No Museu Van Gogh, em Amsterdã, sessões de apreciação consciente da arte fizeram parte, até 2024, de um programa voltado para a saúde mental. Focadas na obra e na vida do artista, essas experiências eram complementadas por aulas de yoga e meditações guiadas (disponíveis até hoje no canal do YouTube do museu).

Mas nem todas as soluções dão conta do problema. É possível que a velocidade da vida contemporânea simplesmente não seja compatível com a proposta original dos museus. Se a atenção se dispersa cada vez mais rápido, a necessidade de reformulação dos espaços expositivos pode ser apenas uma resposta paliativa para um problema mais profundo. Assim sendo, esses espaços ficam entre se adaptar ao ritmo frenético do mundo contemporâneo ou resistir e defender a experiência contemplativa como um valor fundamental. 

Antes de buscar um caminho, é preciso fazer uma pergunta fundamental — uma que tira a importância da distinção entre soluções definitivas ou paliativas e aponta para uma missão: qual é o papel dos museus hoje? 

Talvez, mais do que nunca, seja nos mostrar de que forma podemos reaprender a olhar.