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Seascape with Storm Coming On, de William Turner (1840).
Sociedade

O desejo de sumir como utopia contemporânea

por Revista Amarello

Por que é tão comum sonhar em desaparecer? Largar tudo. Deletar redes sociais. Sair do emprego. Trocar o smartphone por um Nokia 1100, trocar a capital por um vilarejo esquecido. Há algo de profundamente contemporâneo nesse desejo. É a vontade de ir na contramão daquilo que mais caracteriza o nosso tempo: estar sempre conectado, sempre disponível, sempre localizável. Essa centelha da fuga cresce em diferentes contextos, em jovens que não saem da internet, pais esgotados, profissionais urbanos à beira do colapso. Não se trata de um impulso geracional, nem de um sintoma exclusivo de um grupo social. É algo difuso, que atravessa fronteiras e perfis. Vivemos, todos nós, a época do cansaço.

O mundo moderno pede resposta, presença, performance. E, muitas vezes, sem dar muito em troca. Nossa dádiva e nosso fardo: estarmos sempre acessíveis. A que custo? Um levantamento da Zenklub, com apoio da UFRJ, revela que 48,1 % dos profissionais relataram níveis elevados de exaustão e 41,8 % apresentam preocupação constante com o trabalho fora do horário, especialmente mulheres e jovens entre 25 e 34 anos. Quase metade dos jovens brasileiros com menos de 30 anos estão no grupo de risco para esgotamento mental. Esses indicativos deixam bem claro que o desejo de desaparecer não nasce do capricho, mas da urgência de escapar de uma sobrecarga constante. A tela nunca se apaga. O trabalho não termina ao fim do expediente e a vida íntima se dissolve na vida pública. O espaço para o descanso real, para o silêncio, inexiste.

Quando, de fato, paramos para recuperar o fôlego?

Chega a ser estranho pensar num mundo em que você não pode mandar uma mensagem e imediatamente receber uma resposta. Como as pessoas viviam antes disso? Como os pais sabiam se seus filhos estavam bem? Porém, por mais que isso possa ser positivo em alguns casos, num contexto mais geral, em vez de gerar proximidade, gera vigilância, ruído e ansiedade. A Organização Mundial da Saúde já reconhece o burnout como síndrome ocupacional. Mas o burnout contemporâneo não é só do trabalho, é existencial. 

O sul-coreano Byung-Chul Han, um dos filósofos pop do momento, aponta que estamos vivendo o que ele chama de “sociedade do desempenho”, na qual o indivíduo se vê como empresa de si mesmo. 

“A depressão”, escreve ele, “começou sua ascensão quando o modelo disciplinar de conduta — as regras de autoridade e a observância dos tabus que davam às classes sociais, assim como aos dois sexos, um destino específico — entrou em colapso diante de normas que nos convidavam à iniciativa pessoal, conclamando-nos a sermos nós mesmos. O indivíduo deprimido não consegue estar à altura; ele está cansado de ter que se tornar ele mesmo.”

Jenny Odell, autora de Resista — Não Faça Nada, corrobora: “A vilã aqui não é necessariamente a Internet, nem mesmo a ideia das redes sociais; é a lógica invasiva das redes sociais comerciais e seu incentivo financeiro para nos manter em um estado lucrativo de ansiedade, inveja e distração. É, além disso, o culto à individualidade e ao branding pessoal que emergem dessas plataformas e afetam a forma como pensamos sobre nossos ‘eus’ fora da rede e sobre os lugares onde realmente vivemos.”

O resultado? Uma hiperatividade ansiosa, que conduz ao esgotamento, à depressão e, cada vez mais, à vontade de simplesmente sumir.

Cresce, daí, a idealização de uma vida “off-grid”. Apagar redes sociais, largar o emprego, mudar-se “para o mato.” Mesmo dentro das cidades, há formas de desaparecimento, chamadas de “quiet quitting”, “ghosting” e tantas outras. 

Aliás, uma pesquisa da EDC Group, divulgada pela Forbes Brasil, aponta que 11,9 % dos brasileiros adotam o “quiet quitting”, uma postura de recusa a horas extras e dedicação exclusiva ao que é essencial, como forma de autopreservação. O próprio nome já escancara uma problemática, já que, em vez de “desistência silenciosa”, ele poderia muito bem ser chamado de “bom senso.” Cerca de 19,5 % dos entrevistados disseram se sentir angustiados, desmotivados ou sobrecarregados. A maioria são mulheres (59 %) e jovens entre 25 e 34 anos, o grupo que mais adere à prática. 

O interessante é notar que, para se alcançar uma vida profissional sensata, é necessário alguma ação. A escolha de não fazer além é, na verdade, uma resposta ativa diante de um sistema exaustivo. Se nos deixarmos tomar pela inércia, estaremos fadados a uma vida de cansaço e trabalho sem fim. O burnout não é individual, é sistêmico.

Sumir não é uma solução universal. Mas é sintoma de uma sociedade saturada, ruidosa, veloz demais para si mesma. De um sistema que transforma tudo em conteúdo e faz com que a fuga faça sentido, ainda que parcial, ainda que imperfeita.

A utopia do desaparecimento voluntário não está em sumir de tudo, mas, muito pelo contrário, ir de encontro à vida. Gordon Hempton, ecólogo acústico que grava paisagens sonoras naturais, talvez tenha razão: “Silêncio não é a ausência de algo, mas a presença de tudo.”

Queremos fugir para sentir a verdadeira presença do mundo.

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