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#17FéCulturaSociedade

Guerra pela fé nas estrelas

por Leticia Lima

Há séculos uma batalha vem sendo travada entre céu e terra, entre o sagrado e o profano, entre a fé cega e o testemunho dos olhos. É a guerra entre a religião e a ciência, e, neste conflito, muitas vezes a maior vítima acaba sendo a fé.

Em um universo em que mal compreendemos nossa realidade, e em que existem ainda muitos mistérios a serem revelados, a religião e a ciência inevitavelmente competem pela autoridade maior quando se trata da natureza da realidade. Por vezes, avanços científicos ameaçam a versão religiosa da realidade, e instituições religiosas se sentem ameaçadas. Não é à toa que a Igreja Católica muitas vezes jogou seu peso contra novas e “radicais” teorias, como a de Galileu. E não é à toa que o debate entre evolucionismo e criacionismo ainda ferve em partes do mundo.

Se a religião e a ciência são de fato incompatíveis, ou – como hoje argumentam muitos cientistas –, na verdade, complementares, isso é assunto para outra matéria. O importante é entender que se criou uma divisa no mundo ocidental entre religião e ciência muito difícil de superar. Por isso, ao longo dos anos, instituições laicas tiveram muito cuidado ao manter-se afastadas das possíveis controvérsias em torno do assunto religião.

Assim é o caso da NASA, Agência Espacial Americana, criada em 1958 em meio ao furor da Guerra Fria. A religião, porém, era um aspecto fundamental da sociedade norte-americana nos anos 1950 e 1960; algo que os diferenciava de fato dos comunistas ímpios. Entraves eram inevitáveis.

Em 1968, a tripulação do Apollo 8, os primeiros humanos a orbitar a lua, leram um verso da Bíblia durante uma transmissão ao vivo. Ativistas ateus deram entrada em um processo contra a NASA por infringir a separação entre Igreja e Estado. A Suprema Corte Norte-Americana descartou o processo por falta de competência.

Em julho de 1969, o comandante Buzz Aldrin, da nave Apollo 11, foi o primeiro e único homem a receber comunhão no espaço. Presbiteriano, ele mesmo administrou o sacramento, e em seguida tornou-se o segundo homem a pisar na superfície lunar. Entre este ano e 1972, um total de doze homens caminhariam sobre a lua. A grande maioria deles eram cientistas, homens que acreditavam no avanço da tecnologia e na capacidade do ser humano. Para alguns deles, a experiência no espaço foi também muito espiritual. Dois deles, Jim Irwin, do Apollo 15, e Charlie Duke, do Apollo 16, encontraram Jesus na fria atmosfera espacial.

O astronauta Ed Mitchell foi o sexto homem a pisar na lua, em 5 de fevereiro de 1971. Mitchell foi piloto do módulo lunar da missão Apollo 14, ao lado do comandante Alan Sheppard. De acordo com Mitchell, a experiência despertou-lhe uma consciência maior. Seu livro The Way of the Explorer: An Apollo Astronaut’s Journey Through the Material and Mystical Worlds [“O Caminho do Explorador: A jornada de um astronauta da Apollo através de mundos materiais e místicos”, ainda sem tradução no Brasil], publicado em 1996, gerou muita polêmica. No livro, Mitchell conta que “O que vivenciei durante aqueles dias de viagem de volta para casa não era nada menos do que um senso de conectividade universal”, referindo-se ao que descreveu como uma religação sua com o cosmos. “Na verdade, senti um êxtase de unidade com o espaço”. Mitchell escreveu que nossa ação como viajantes espaciais e a existência do próprio universo não eram acidentais, mas que havia uma lógica inteligente por trás disso. “Percebi que o universo é, de algum modo, consciente”.

Ao voltar à Terra, Mitchell dedicou-se a estudar literatura e práticas místicas, incluindo as religiões hindus e budistas. Obteve suas primeiras experiências transcendentais e, em especial, samadhi, uma palavra sânscrita que descreve um estado de consciência e unidade total. Ele garante que a possibilidade de uma experiência transcendental existe em cada um de nós, inerente a todo organismo vivo. Em 1973, fundou o Instituto de Ciências Noéticas (palavra que vem do grego nous, ou mente) para difundir tais conhecimentos. Diz Mitchell que a experiência de enxergar a Terra de fora ampliou seus horizontes. Passou então a querer buscar respostas espirituais para os fatos materiais da vida, e se tornou um ufologista dedicado. Em seu livro, afirma que muitos dos relatos de óvnis avistados desde o incidente Roswell eram de visitantes de outros planetas. Diz ainda que essas espaçonaves foram “objetos de desinformação pelos governos, de maneira a desviar a atenção dos povos em geral e criar confusão para evitar que a verdade viesse à tona”.

Mitchell é um caso interessante, pois, apesar de não ser o único cosmonauta que relatou uma crença em – ou contato com – extraterrestres, é o mais vocal deles. Talvez uma análise de sua infância possa explicar um pouco a tomada espiritual que teve no espaço, pois, afinal, foi criado muito próximo a Roswell, Novo México, infame local da suposta aterrissagem de uma nave espacial, em 1947. Muitos adeptos das conspirações acreditam até hoje que o incidente foi encoberto pelo governo dos EUA. Entre eles está Mitchell, que possui doutorado em aeronáutica e astronáutica do prestigiado Massachusetts Institute of Technology (MIT) e foi capitão da marinha norte-americana antes de ingressar no programa incipiente da NASA. Esta mente científica brilhante é a mesma que apresenta o mesmo fervor religioso de um fiel na sua crença em óvnis.

A verdade é que a exploração espacial é um ato de fé. A ciência nos deu a capacidade de lançar o homem ao espaço, mas é preciso muita fé para querer ser lançado. Afinal, ninguém pode dar garantias de uma volta segura. O astronauta israelense Ilan Ramon levava consigo uma cópia da tradicional benção judaica Shabbat Kiddush quando a sua nave Columbia explodiu, matando Ilan e seis outros em 2003. Em 2007, o cosmonauta Sheikh Muszaphar Shukor, mulçumano praticante, rezou várias vezes ao dia durante sua estadia de 11 dias na Estação Espacial Internacional – uma façanha nada fácil, uma vez que satélites em órbita passam por diversos pores-do-sol diariamente, mudando também a direção de Meca. Em 1986, o Papa João Paulo II liderou o mundo numa prece pelas vidas perdidas no acidente mais notório da agência espacial norte-americana, a explosão do ônibus espacial Challenger.

São muitas fés: fé na capacidade humana, fé na ciência, fé em Deus, fé em que não estamos sozinhos no universo. No limiar entre o que a ciência explica e o que a fé dita, o espaço realmente é a última fronteira.

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