Rituais em brasileiro: como nasce um perfume?
A linha Amarello Rituais Em Brasileiro chegou para celebrar os rituais particulares que constituem a parte mais fundamental da nossa existência. Tanto a Água de Colônia Folha de Tomate quanto a Água de Colônia Mel de Cacau foram lançadas justamente para promover esse encontro entre nós e a nossa essência, com ambos os aromas trazendo a calmaria singular daquilo que é frequente e seguro. Mas como traduzir as ideias por trás desses estímulos olfativos em uma embalagem?
No vasto espectro da criação, existe um desafio que transcende a mera materialidade: a tradução de um aroma e um conceito, ambos intangíveis, em algo palpável. Esse é o território onde a magia do design de produtos se entrelaça com a complexidade dos sentidos humanos em um intricado jogo de formas e significados. É desde os primórdios da civilização que os seres humanos têm buscado meios de dar forma às suas ideias mais profundas, seja através de esculturas, pinturas, arquiteturas ou, mais recentemente, produtos. Hoje em dia, os símbolos são mais abundantes, mas também parecem durar menos — o que pode ser um desafio, especialmente se o objetivo for criar algo duradouro.
É nesse contexto que conversamos com Bárbara Bareca, designer de produto das duas águas de colônia. Em suas palavras e experiências, encontramos insights sobre o processo criativo e reflexões sobre a busca pela extensão da beleza e como os processos podem variar de país a país.
Pensando nas garrafas das águas de colônia, qual foi o processo para chegar a um resultado final?
Bárbara Bareca: Acho que o processo começa já com algumas coisas entrelaçadas e a gente já tem uma ideia do que quer fazer. No caso, a gente já sabia que queria fazer uma colônia e tinha algumas informações técnicas. Por exemplo, a volumetria. A partir disso, a gente tinha que tentar traduzir o que a gente queria do aroma para a garrafa. A gente estava querendo fazer uma garrafa nada parecida com o que a gente vê hoje em dia nas perfumarias. Como a gente sabia que o nosso produto era um produto de perfumaria de luxo, a gente tinha que ter um desenho atrelado a isso. Ao mesmo tempo, esse desenho teria que causar um desejo de compra, mesmo pensando numa questão de mercado. O processo aconteceu a partir daí.
Foram muitos desenhos e os desenhos também traziam dificuldades técnicas, porque, como a produção seria 100% brasileira, a gente também tinha que entender isso enquanto produção. A gente até fala que todo desenho cabe no papel, mas para fazer é uma coisa totalmente diferente. Partimos para alguns desenhos, conversando com algumas pessoas em conjunto, como fabricantes de moldes, os fabricantes de vidro, desenhistas e técnicos, para a gente conseguir adequar essas nossas vontades de desenho ao que cabia na produção. Nisso, a gente fez algumas impressões 3D para entender esses volumes, para poder pegar, sentir na mão, entender o tamanho, entender se a gente aumentava o diâmetro, se a gente aumentava a altura, se a pegada estava boa. Para isso, a gente fez dez mockups. Foram dez protótipos para a gente ir entendendo as mudanças a partir do momento em que via essas peças prontas. Passamos por tudo isso para conseguir chegar na garrafa que a gente tem hoje.
Como foi sua experiência com pequenos ateliês de vidro?
BB: Ainda existem alguns ateliês de vidro no Brasil, mas, obviamente, um número muito menor do que tinha na década de 60 e 70. Era um material muito usado e hoje foi muito substituído pelo plástico. Fiquei surpresa, e grata também, por conseguir ter acesso a isso. São ateliês, são lugares pequenos, são produções pequenas, mas eu acho que é uma manufatura muito possível. Eu, particularmente, nunca tinha trabalhado com vidro dessa forma. A Amarello já tinha alguns outros produtos feitos em vidro, mas com uma técnica muito diferente, mais manual. As garrafas passam por um processo de molde de vidro soprado. Ou seja, você precisa entender quais desses ateliês conseguem fazer o tipo de produto que você deseja, porque não são todos. A gente passou por dois para poder chegar em um que conseguiria entregar a garrafa do jeito que a gente queria.
Mas é interessante saber que a gente consegue ainda produzir esse tipo de produto no Brasil, em pequenos ateliês ou pequenas fábricas. A nossa produção não é grande, mas é algo totalmente possível. Temos algumas restrições, mas eu acho que o mais importante de tudo é essa noção de que é, sim, possível produzir vidro aqui.
O que deve ser considerado para chegar a uma estética que converse com aquele produto, com aquele aroma?
BB: É preciso saber principalmente qual é a identidade do aroma e qual é a estética dessa identidade. Só assim a gente consegue fundir uma coisa com a outra e fazer com que isso converse. Quando foi definido quais seriam os nossos aromas, a gente teve que buscar a identidade desses aromas, a identidade da Amarello, a identidade dessa pesquisa, desse projeto e dessa linha dos rituais, para conseguir desenvolver um desenho que fosse esteticamente compatível a essa identidade. As coisas precisam conversar. Entender a identidade do que se deseja é sempre o principal.
O processo seria muito diferente se estivéssemos em outro país? Tanto em aspectos geográficos quanto culturais.
BB: Seria totalmente diferente! O Brasil é um país de manufaturas. A gente é muito rico em manufatura, em artesanato, em técnicas identitárias. Então, eu acho que a gente detém essa riqueza, que é um grande luxo. Mas, se tratando de uma escala industrial, a gente apanha muito. A produção aqui é caríssima. Precisa-se fazer quantidades absurdas para que a gente consiga um bom preço. A gente não tem muita viabilidade técnica. Igual eu disse, a gente conseguiu chegar em duas empresas que faziam vidro soprado e, mesmo assim, elas não detinham todas as técnicas.
Se a gente tivesse em um país desenvolvido, obviamente a gente teria essa facilidade industrial. De quantidade de cor, de molde, de opções de ateliês, opções de profissionais. Mas aqui no Brasil isso é muito, muito limitado. É um pouco difícil, mas não é impossível. Ainda é possível com que a gente fabrique aqui. Mas temos muitas, muitas, muitas limitações. É uma indústria muito cara.
O que mais fez seu olho brilhar na história toda?
BB: Conseguir traduzir numa coisa física tanto o aroma quanto o líquido. Traduzir numa coisa física um projeto que começa com os rituais do dia a dia. Isso fez meu olho brilhar. E também o fato da gente conseguir fechar o ciclo de vida de um produto. Eu acho que isso é muito importante também. Desde quando a gente começou a falar em fazer colônia? Há muito tempo. Tem que definir os cheiros, definir as notas, definir os nomes, a identidade visual, o desenho da garrafa, se adequar à produção, definir as embalagens, ao mercado, aos valores de custo, aos valores de venda. É um mega processo. Conseguir traduzir fisicamente um conceito e um aroma, somado ao fechar um ciclo longo com sucesso, fez com que tudo fosse especial.