Não há virtude no silêncio. Os que pregam o calar no lugar do falar o fazem porque se envergonham do que teriam ou não a dizer. Quem teme a palavra teme a verdade. Quem teme o debate teme a presença e a luz. O silêncio é o vácuo, é a treva, atraente e perfeito como valhacouto da ignorância, da antiética, da covardia.
O silêncio é a burca da alma. E a palavra, sua nudez. A beleza dos corpos e das opiniões está na diferença: quanto mais ampla e diversa, melhor. Quão variadas são as formas da beleza física, e quão parecidas com o espírito das pessoas? Quanto mais inocente e despido, mais bonito e verdadeiro é o ser humano. A nudez das crianças, dos povos primitivos, dos miseráveis é sempre bela e comovente. Ridículo e abjeto só pode ser o general sem farda, o acadêmico sem fardão, o padre sem batina, o senador sem casaca e, sobretudo, o rei sem manto.
Qualquer opinião é melhor do que o silêncio. Tinha toda razão Martin Luther King quando falou que “o que preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons”. O verbo está no tempo certo, porque, ao contrário do homem, a palavra é viva. O silêncio, não. Pode até ser lembrado, mas sempre como um morto.
As razões para a boca calada são muitas. Há quem cale por medo, há quem cale por dinheiro, há quem cale por interesse, conveniência, inconsciência. E há quem cale por amizade, solidariedade, compaixão; por amor há quem se cale – é mais raro, porém. Por virtude, de modo geral, só se cala sob tortura.
O Homem afirma a própria existência quando rompe em um berro, pondo fim à paz uterina. Feito isso, é orientado a calar novamente, ser um bom menino para a própria tranquilidade e para o conforto dos que o cercam. Assim, atravessamos a vida, associando o silêncio à paz, sem perceber que esta só será verdadeira quando todos puderem dizer o que bem entenderem. O pior mudo é o que não quer falar.
O pior mudo é o que não quer falar
por Léo Coutinho