CulturaLiteratura

A bailarina na corda bamba

por Helena Cunha Di Ciero

Para minha mãe,
Para sempre
.

Escrevo porque não me caibo.
Minhas palavras são meus instantes.
Grama suave onde me deito, orvalho delicado.

Não penso que me exponho assim.

O que tenho em mim guardado
Quando vira frase, está transformado
Minhas palavras saem da minha pele.

Escrevo para respirar,
desaguar lágrimas
Desengasgar

Letras abraçam o que dentro de mim me deforma.
Letras me dão forma
Palavras, oxigênio.
Olho para o papel: Liberdade.
Nas linhas da folha branca a grafia se equilibra numa dança suave.

Sou um funâmbulo no picadeiro caminhando na corda bamba da linha do caderno.
Olho para baixo, abismo.
Olho para cima, um teto colorido
Caminho na linha reta.

Escrevo com meu chão aberto
Estou seguindo, ereta.
Eu e a caneta: Duelo.
Letra e papel: Dueto

Caneta na mão,
vara de condão.
Malabarismo.
Começa a sessão do circo,

Há um leão a ser domesticado dentro de mim.
Tenho medo da sua boca escura.
Enfrento:
Caneta na mão:  espada.
Encontro a rima,
Sou bailarina.

A corda estica.
Caminho nas frases a procura de equilíbrio.
Para sossegar o jazz do meu coração.
Escrevo. Ponto.

Palavras que se sintonizam, harmonia, sossego.
Escrevo, esse é meu ponto, de encontro.
Escrevo, pois, a tela da vida não me basta
ao mesmo tempo me afoga em água.

Escrevo como quem coloca legenda numa cena de filme.
Escrevo, logo existo.
Escrevo, logo persisto.

Minhas palavras são pontes,
Eu e o mundo.
Pontes que atravessam o tempo e o espaço e chegam até o céu.

Nas palavras seguimos: Eu e você.  
Na vida eu enxergo: Eu sem você.
Se eu escrever seu nome ao lado do meu,
em algum lugar caminhamos de mãos dadas.

Ainda.

Podemos ao menos numa frase ser futuro.
unidas agora por um outro cordão: 
a linha do papel
Onde escreverei teu nome, eternamente.