Arte de Alvaro Seixas, capa da Amarello Erótica.

Meus desenhos partem da sedução que a imagem do outro exerce sobre mim. Sempre dediquei a minha atenção à linguagem encoberta nos corpos que não habito: sua intrincada complexidade mitológica, poética e política.

Sou fascinado pelas aquarelas de Rodin, pelos desenhos de Jean Cocteau, Ismael Nery e Tunga. Também pelas fotos de esculturas antigas feitas por Alair Gomes a partir de ângulos obtusos (eróticos) durante seus passeios pela Europa. Recentemente, me encantaram as figuras múltiplas retratadas por Lorenza Böttner.

Mas, uma de minhas obras de favoritas é o desenho de Leon Bakst representando Vaslav Nijinsky de fauno, feito para os Ballets Russes. A figura dançante e satânica desse bailarino fantasiado de divindade romana sempre ofereceu visões maravilhosas. Me interessa, dessa forma, essa fantasia do corpo, ou, ainda, esse enigma do corpo e sua penumbra ficcional. Não me interesso tanto pela arte e pelos corpos idênticos e reduzidos ao “inferno do igual”, para pegar emprestado uma expressão do filósofo Byung-Chul Han.

O sagrado tem algo a ver com esse enigma. O sagrado é erótico, uma entidade misteriosa que não se revela tão facilmente para nós. É a imagem do cupido que sorri com alguma malícia pois sabe que, para oferecer prazer, precisa necessariamente flechar a carne. É o mesmo sagrado do êxtase de Santa Teresa e por ela mesma narrado quando reencenava suas experiências místicas para as freiras do seu convento. O sagrado é o anjo de mármore, na escultura de Bernini, que atinge e faz contorcer a carne de Santa Teresa com uma flecha sagrada. O ritual religioso é indissociável da carne, pois é na carne que o sagrado se manifesta.

Ao desenhar, tento entrar em contato com esse erotismo sagrado e sua natureza contraditória: “as lágrimas de Eros” como nos falou Bataille. Ao desenhar, tento me distanciar do que é profano: do que é explícito, transparente e excessivamente luminoso. Precisamos das feridas eróticas, pois elas se opõem à matemática do regime da informação, desprovido de alteridade e narração.