Yes, nós somos barrocos – Amarello 39

Ao apresentar uma identidade brasileira formada a partir da exuberância, dos excessos e das suas inúmeras contradições, a Amarello lança a edição de número 39, trazendo o músico Jorge Mautner na capa.

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O calor intenso faz o suor correr por todo o meu corpo. Suo muito e, por muito tempo, lutei contra o meu suor. Ora pela umidade excessiva, ora pelo odor exagerado. Perdi. Penso que assim, tentava superar, talvez por ser descendente de italianos, onde faz frio, o nojo que me foi ensinado a ter do suor. Perdi.

O Barroco legitimou exageros. Nasceu na Europa, como ferramenta da Contrarreforma para tentar resgatar fiéis para a Igreja Católica, que andava em baixa naqueles tempos. Estética boquiaberta, afirmava a fé pela matéria. Ouro, ornamento, adorno. O Barroco encontrou no Brasil o seu melhor palco.

Penso quando o indígena encontrou o branco e adoeceu. Quando encontrou o negro e povoou. No europeu, quando aqui viu pela primeira vez a força da luz de Salvador. Quando Henry Ford sentiu o calor molhado da Amazônia, e viu seu sonho americano ser vencido pelo trópico. Yes, we are bananas. Yes, estamos digerindo mal há muito tempo. O Brasil é uma apropriação que nem da própria apropriação se apropriou.

Aqui tudo é excesso, emoção, incoerência, contradição. O corpo e a alma. O barulho, a linguagem, o espaço, a luz onipresente, o ouro, o calor, a mata, o contraste de classe. O terror e a glória. A alegria e a tristeza acachapantes. Somos um país de verdades múltiplas, coberto pelo manto de candura da hipocrisia tropical, que aqui se formou onde tudo se dissolve no “pitoresco”, no “saboroso”, no “gorduroso”, no “apimentado”. Na nossa cultura moralista, que demole e não contrasta, é preciso passar por uma revolução de costumes. Tirar o véu dos olhos do querubim. O Brasil é um sonho que precisa ser despertado.

Por fim, não há coisa mais excessiva e confusa que a impossibilidade de conseguir definir a identidade brasileira – algo que, inclusive, faz parte da nossa própria identidade. Ah, e a esperança num futuro melhor: precisamos perdê-la para então reencontrá-la de outra forma, menos romantizada, nem “leve” nem “etérea” – barroca.

Antes de definir um entendimento restrito desse barroquismo, preferimos nos identificar como tal, com orgulho e alegria. 

Brasileiro não é antitranspirante. Se não aprendermos a conviver com o nosso suor, seus excessos e exageros, nem amor fazemos mais. Por isso, peço desculpas aos minimalistas, aos simplistas, aos perfeccionistas e aos simplórios – porque Yes, nós somos barrocos!

Tomás Biagi Carvalho