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A trilha São Paulo Francis

por Léo Coutinho

Há dez anos, num domingo junino, a Folha de São Paulo chegava com uma dica do Elio Gaspari, que comprei no ato e que venho seguindo desde então. Está no acervo do jornal: “Adele vai para a Trilha Paulo Francis”.

O Retrato Adele Bloch-Bauer, pintado por Gustav Klimt em 1907, confiscado pelos nazistas em 1938 e só recuperado do governo austríaco sessenta anos depois, por decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos, última instância de apelação de uma sobrinha de Adele chamada Maria, cidadã americana, tornava-se o quadro mais valioso da história, vendido por US$ 135 milhões para Ronald Lauder, magnata dos cosméticos e mecenas que criou a Neue Galerie justamente na Trilha Paulo Francis, em Nova York. A história deu um filme ótimo: A Dama Dourada.

Francis não viveu para ver, mas é de se supor que folgaria com a notícia da trilha ainda mais rica. Ela “começa no restaurante Bravo Gianni (rua 63, entre a 3ª e a 2ª avenidas), onde o jornalista costumava almoçar. Daí segue para a Coleção Frick (5ª avenida com rua 70). Francis parava ali por três razões, não necessariamente nesta ordem: rever o autorretrato de Rembrandt, ir ao banheiro (um luxo) e usufruir a agradável temperatura da galeria. O museu Metropolitan (5ª com rua 82) era o pouso seguinte, num percurso que acabava na sala da Princesa de Broglie, de Ingres, e da Condessa de Altamira, de Goya”. Obrigado, Elio.

Mas o que eu queria dizer é como adaptei a Trilha Paulo Francis ao meu cotidiano em São Paulo. Desde que o Jockey Clube fechou a sede da Rua Boa Vista, não tenho mais um banheiro predileto – nem um salão de barbeiro ou uma biblioteca com gravuras do Di Cavalcanti. Ou, por outra: o do Theatro Municipal (Praça Ramos de Azevedo) é lindo, assim como o prédio todo, incluindo as novidades dos Irmãos Campana no restaurante. E por aí vai a minha trilha.

Como se vê, o roteiro não é necessariamente artístico. Ainda no Centro, vale uma pausa para café e sobremesa na Casa Mathilde (Praça Antonio Prado), ou para engraxar os sapatos com o Daniel Bigode (Largo do Café). Porém, tenha sempre em mente o Centro Cultural dos Correios (Avenida São João, s/n) e o do Banco do Brasil (Rua Álvares Penteado, 112).

Se você estiver na Paulista, o MASP é óbvio. Às terças-feiras é grátis e o bilhete economizado será muito bem direcionado se revertido para um café ali embaixo, no Mirante Nove de Julho (Rua Carlos Comenale, s/n). Na ponta do Paraíso, substitua pelo Itaú Cultural (nº 149) e, na da Consolação, pela Livraria Cultura do Conjunto Nacional (2073).

Prefere ar livre? Fique com o vão do MASP ou atravesse para o Parque Trianon. O do Shopping Cidade de São Paulo, esquina com a Pamplona, também é bom. No Paraíso, escolha entre a Casa das Rosas (37) e o Hospital Santa Catarina (200), cujo jardim, embora escondido, permite visitas. Na Consolação não há jardim. Melhor descer para os “Jardins”.

Na própria rua da Consolação, encontre as galerias Mendes Wood (3358) e a Baró (3417). Na Bela Cintra (1533), a Mônica Filgueiras. Na Hadock Lobo com Estados Unidos, vá à Dan Galeria e, com sorte e alguma cara de pau, consiga um café no escritório do Peter Cohn, com preciosidades na prosa ou sobre tela. Continuando pela Estados Unidos, visite a Zipper (1494) ou a Casa Triângulo (1324). E em hipótese alguma deixe de subir a Padre João Manuel para ver o que há na Luisa Strina (755).

Descendo rumo à Faria Lima, visite o MIS (Av. Europa, 158) e o MuBE, vizinho cujo prédio, sozinho, já é um deleite, e, mais adiante, a Nara Roesler (Av. Europa, 655). Já na Cidade Jardim, entre na Lume (Gumercindo Saraiva, 54). Ou suba a Nove de Julho até a Luciana Brito (5162 – é longe, melhor se você estiver pelo Itaim Bibi), cuja casa está para as galerias como o MuBE para os museus, por obra do Paulo Mendes da Rocha e do Rino Levi, respectivamente.

E há mais, muito mais. Num extremo da Gabriel Monteiro da Silva, tem a Galeria Rabieh (147) e a Papel Assinado (306), e, no outro, a Urban Arts (1984). Nas transversais, Art Hall (240 da Cônego Eugênio Leite) e a e-arte (Joaquim Antunes, 187). Em Pinheiros, o Instituto Tomie Ohtake (Coropé, 88), e, na Ferreira de Araújo, o Centro Brasileiro Britânico (741) e o Studio Dama (1056). Escalando a Vila Madalena, eu cansaria esta freguesia com tantas opções para descansar numa pausa entre uma ladeira e outra.

O importante é que os endereços estão aí e tudo o que os galeristas querem é a sua visita naquela meia hora que sobra depois do almoço. Aproveite. No verão, refresca. No inverno, aquece. Alimenta o espírito, é bom para a digestão e não custa nada.