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#28O FemininoArtigo

Editora Convidada: Helena Cunha di Ciero Mourão

por Helena Cunha Di Ciero

“Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.”

Carlos Drummond de Andrade

Era uma noite linda de sábado, festa grande. O casamento repleto de orquídeas que desciam do teto; noiva feliz, festa cheia, decoração impecável. Entrei no banheiro para tirar os grampos do cabelo, que me incomodavam, e ouvi três mulheres conversarem amigavelmente. Uma era uma moça loira de vestido bordado e joias, que amamentava seu bebê numa cadeira de veludo vermelho no canto do banheiro. As outras duas estavam de uniforme e eram responsáveis pela limpeza – estavam em pé, usavam touca e avental.

O papo estava animado; falavam sobre gravidez, seios doloridos, bebês esfomeados, parto e a solidão da madrugada. Havia uma ternura no diálogo que encobria a diferença social. Eram mães, acima de tudo. Biologicamente programadas para gestar. E falavam com alegria de suas crias, da aventura de cuidar de alguém, dos desafios, trocando experiências com satisfação.

Ver a cena pelo espelho me tocou ao mesmo tempo que me trouxe uma pergunta: em que circunstâncias mulheres tão diferentes falariam de uma situação tão íntima se não tivessem como pano de fundo comum a maternidade? É que as mães se reconhecem pela veia do coração. Há uma identidade partilhada, uma dor e um desamparo: existe alguém que depende de mim.

Antes de ter filho, via minha mãe como uma entidade, um totem, aquela que sabia tudo, a pessoa para quem eu perguntava antes de todo mundo sobre qualquer assunto. Depois, descobri que mães são só pessoas, meninas assustadas, aflitas, inseguras, tentando acertar. Que vão assumindo aos poucos o papel materno, mas não sem angústia.

Foi uma surpresa muito gratificante o grupo de mães que conheci na escola dos meus filhos. Confesso que sempre tive medo e até certo preconceito, mas foi surpreendente a maneira como pude contar com a ajuda dessas mães, a disponibilidade que encontrei nessas mulheres – que viraram minhas amigas e me apoiaram – e a qualidade da relação que construímos. Foi fácil contar com elas nessa fase tão importante da vida dos meus filhos, a primeira infância.

Durante os últimos anos, vivemos nascimentos, mortes, doenças, separações e amores. Trocamos abraços em momentos de celebração e de conquistas das crianças e tivemos um momento em que esse grupo teceu uma rede de coragem para amparar uma de nós que sofria por um bebê que nasceu doente. Todas nos sentíamos impotentes e, portanto, oramos juntas, mesmo com religiões diferentes, doamos sangue, oferecemos abraços e uma taça de vinho para atenuar a dor. Em troca, essa mulher nos ensinou sobre a dignidade de uma mãe que enfrenta a morte de cabeça erguida, protegendo o filho vivo de sua dor. E tem gente que chama escola de educação infantil… Não para os pais.

É que uma criança é criada por uma aldeia, não por uma pessoa, como diz um ditado africano. Eu humildemente acrescento que existem mulheres – “tias”, avós, amigas da mãe – que dão um contorno, ajudando a construção desse ser em desenvolvimento que é a mãe.

A feminilidade se constrói com a ajuda de outras mulheres; é uma espécie de herança transmitida de geração em geração, através de um vínculo delicado e sutil. É a partir da relação com a mãe que as meninas se fazem femininas. Essa relação permeia a feminilidade e é estruturante da relação entre mãe e filha que virá futuramente. Para ser mãe, é necessário o registro da mãe que antecedeu. Esse vínculo é uma referência fundamental para quase todas as relações significativas experimentadas ao longo da vida. Mãe e filha estão ligadas para sempre através de experiências concretas e inconscientes. Não é à toa que somos representadas pelo laço de fita.

Outro dia, minha filha tirou a fralda, e saímos eu, ela e a avó para comprar sua primeira calcinha. Acho que inconscientemente queríamos dizer: seja bem-vinda.

Ao olhar para minha história, o que vejo, antes de grandes transformações, são as amigas. Da escola, da faculdade, minhas tias e primas que me ajudaram nos ciclos da vida. Nós, mulheres, fazemos um coro de amor e coragem que nos sustenta ao longo dessa jornada. Somos como aquelas bonecas russas, as matrioscas: carregamos dentro de nós muitas mulheres que nos ensinaram a crescer.

Não é à toa que as famílias brigam pelas joias da vovó. Elas têm um valor além-material. Representam esse diamante lapidado pelo amor e pela lealdade que nos dá força para trilhar a aventura da vida.

E às invejosas, que não conseguem aproveitar o tamanho desse laço que envolve o feminino, desejo vida longa.

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