12.199
(Sara Ramos)
para Carreira Comprida,
a praia submersa
navego desde pequena
nomes de barcos são sempre femininos
nomes de barcos são sempre nomes de mães
mas a voadeira é sempre uma voadeira
rasa fina fatal
os prazeres:
não resta corpo intocado pelo vento
só fala o motor
só falam as águas
navego de voadeira desde pequena
as mães falam delas
como falam dos homens
uma voadeira é sempre uma voadeira
tenha medo, não faça graça
não se distraia, prenda os cabelos
na pilantragem, Lázaro
esse é o jeito de te dizer adeus
(Natasha Felix)
Lázaro suas feridas são as minhas feridas
a pele descansando na pedra
mera distração
detalhe que se esquece
a história que vamos contar não é essa
uma chaga só pode reconhecer outra chaga
uma imagem só pode reconhecer outra imagem
no escuro
estendo minha mão esquerda em direção a Lázaro
o que alcanço não tem nome
não é Lázaro e é feliz por isso
vai embora
me leva junto enquanto fico
as garras polidas
cravadas no asfalto
o sol é bom o sol é justo e queima comigo
Sara Ramos por Natasha Felix:
Enquanto peço para Lázaro me levar para esse lugar ainda sem nome, algo acontece em outro lugar. Um alerta. Imagino duas mulheres embarcando, uma delas ampara a outra pelo quadril à beira do Rio Tocantins. Lembro de Lázaro na catraia, a travessia entre Santos e Guarujá, contando as moedas. Sempre pela madrugada. Em Santos não dizemos voadeira, dizemos barquinha. Tem o mesmo fim, por isso os mesmos medos.