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Nós e eles: como pensar o direito dos animais?

por Leticia Lima

“Afirmar que é o destino dos antílopes serem mortos e devorados por outro animal equivale-se a dizer que é o destino das mulheres serem estupradas. Ambos são terrivelmente equivocados, e ambos negam o sofrimento de suas vítimas.”

Assim a filósofa Martha Nussbaum causou polêmica e, em muitos, revolta, ao comparar o estupro de mulheres com a predação natural entre os animais. Seu comentário, escrito no artigo “A People Wilderness” para o New York Book Review em 2022, seria apenas uma infelicidade fosse Martha C. Nussbaum um ser qualquer. Porém Nussbaum é uma personalidade de peso. Professora emérita de direito e ética na Universidade de Chicago, ela acumulou durante sua longa carreira mais de 50 títulos honorários em conceituadas instituições de ensino superior ao redor do mundo.

Nussbaum ganhou fama no início da década de 1980 com sua teoria das capacidades, na qual argumenta que uma sociedade justa deve fornecer o mínimo social básico para que cada indivíduo tenha a chance de atingir a sua capacidade máxima – ou seja, o máximo que cada pessoa é capaz de fazer. Isso inclui direitos básicos como segurança, moradia, saúde e educação, mas também socialização e diversão, pois, afinal, nós humanos somos seres sociais. Até aí, em nada discordo. Quem passou pelo isolamento de um lockdown durante a pandemia sabe muito bem a importância do social no cotidiano. Agora, Nussbaum vira seu enfoque das capacidades sobre animais não-humanos.

Não há dúvida de que vivemos um momento de preocupação com o nosso relacionamento com os animais. O vegetarianismo e veganismo ganham cada vez mais adeptos, provando que não são apenas uma moda. A pandemia global problematizou práticas como os mercados úmidos. A presidência Bolsonaro voltou a atenção do mundo ao desmatamento e destruição de habitats naturais em prol da indústria pecuária. O fato é que já não podemos e nem devemos mais evitar o debate sobre a nossa responsabilidade coletiva sobre os animais não-humanos. 

A questão é até que ponto devemos levar essa responsabilidade. Todos os animais do mundo são afetados por comportamentos humanos. Leis nacionais e internacionais governam como devemos criar, sustentar e abater animais para o consumo humano, como devemos tratar animais domésticos, e como devemos proteger e conservar espécies silvestres, proibindo a sua caça, criando áreas de proteção e até criando programas de inseminação artificial para garantir a continuação da espécie. Mesmo aqueles animais que não são regulamentados por nossas leis são afetados por nossas práticas. Poluição, plásticos e tóxicos se espalham pelo solo, pela água e pelo ar, comprometendo todos os animais do planeta. 

O problema, de acordo com Nussbaum, é que estas leis são criadas através do prisma das necessidades humanas. Não estamos tratando animais como seres que merecem alcançar sua máxima capacidade dentro dos parâmetros de sua espécie. Precisamos trocar o enfoque para as necessidades de cada animal. Nussbaum lista as capacidades que acredita merecerem os animais. A lista  inclui a possibilidade de viver uma vida longa, com boa saúde e com liberdade de movimento e o usufruto de todos os sentidos (visão, olfato, paladar, audição e tato), de pensamentos e da imaginação. A possibilidade de vivenciar emoções como o amor e compaixão, de poder raciocinar e de fazer parte de uma comunidade e desenvolver elos sociais. E mais, de poder viver em harmonia com outras espécies, brincar e se divertir, e exercer algum controle sobre suas próprias vidas. 

A implementação desta lista imediatamente levanta uma série de problemas, ao começar pelo fato que, ao contrário do que Nussbaum diz querer – afastar o enfoque humano dos animais – cria-se um antropomorfismo absurdo. Ela atribui desejos e capacidades humanas aos animais. Ainda não compreendemos o raciocínio e as emoções dos animais a ponto de garantir que a compaixão que eles exibem é a mesma que sentimos, ou que viver em harmonia com outras espécies seja um desejo, ou sequer entre nos pensamentos, de um animal que come e é comido na cadeia natural de predação. O leão sente pena da zebra?

De acordo com Nussbaum, o sofrimento de criaturas vulneráveis tem grande importância e pede alguma ação inteligente. Ser devorado por um predador não faz parte dos objetivos de vida de qualquer animal. Portanto, para garantir que cada animal pudesse atingir as suas capacidades plenas, teríamos que acabar com a cadeia alimentar natural. Como? A filósofa não apresenta uma solução. Reconhece que, “somos muito ignorantes e se tentássemos interferir com a predação em larga escala, provavelmente causaríamos um desastre em escala global.” Eu estou certa de que comparar uma gazela sendo comida por um leão com o estupro de uma mulher não é a solução. É uma equivalência moral absurda. Absurdo também é fingir que podemos tirar o enfoque humano sobre o debate dos direitos animais. Só poderemos assumir uma responsabilidade coletiva perante os animais a partir do momento que reconhecermos nosso impacto sobre eles, e também reconhecermos nossa interdependência com eles. São alimento, companhia, e parte integral do delicado equilíbrio de nosso planeta. A solução talvez não seja mais interferência na natureza, e sim uma interferência mais cautelosa e mais bem pensada. 

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